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Vitrine humana

 

 

"Numa torre de orgulho e de desdém!" (Florbela Espanca)

Por Leiliane Germano

Há alguns meses atrás, sentada na minha mesa produzindo as pautas do jornal em que trabalho, me deparei com uma situação engraçada, a primeiro momento, mas crítica ao mesmo tempo. O ator Stênio Garcia estampou timelines e jornais de todo o país com seus nudes ao lado da esposa. Situação que inclusive abalou e a mulher do artista a esclarecer diante da mídia o desconforto que estava sentindo com essa exposição indesejada. Para você que não sabe as fotos vazaram na internet.
    Não é a primeira vez que pessoas famosas se tornam manchetes dos posts de fofoca ou viram memes por terem suas fotos íntimas jogadas nas redes. A atriz Carolina Dieckmann que o diga, seu caso inspirou até uma lei contra esse tipo de crime. 
Na maioria das vezes as imagens foram compartilhadas entre casais ou amigos íntimos através da internet. Aliás não só as pessoas famosas se envolvem em casos assim. Já atendi o telefone da redação e ouvi um leitor relatar que imagens suas e de sua família haviam sido hackeadas e usadas em perfis fakes.  
    Quando se fala de exposição indevida logo se lembra de quem rouba as imagens. Os namorados, namoradas e todo tipo de pessoa mal intencionadas que jogam os nudes dos ex parceiros (ou de desconhecidos mesmo) na internet. Sem falar nos vídeos de relações sexuais que "por engano" se tornam virais. Mas será que essa é questão chave? Em um mundo conectado (acredite aqui essa constatação não é clichê) será possível ter 100% de privacidade? Ou melhor, será que ainda existem pessoas que desejam viver em total privacidade? 
    Para onde se olha é possível ver inúmeras pessoas clicando em seus smartphones e postando seus passos ao longo do dia. Basta abrir o Facebook que as timelines estão entupidas de histórias pessoais, fotos e informações de terceiros. Um excesso de exposição que os próprios donos insistem em promover. 
    A vitrine humana serve para aliviar tensões, gastar o tempo, observar os amigos e, em alguns casos, ver que sempre tem alguém pior que você. Há quem diga que isso é um consolo. O vazio das relações e o excesso de vaidade têm tornado a internet um remédio para as carências pessoais. Afinal existe algo mais cômodo do que sentar dentro de um quarto e poder bater altos papos na frente do monitor? Ou com poucos cliques dentro de um ônibus conquistar várias comentários e amigos virtuais? 
    Um simples post em uma mesa de bar ou no espelho do banheiro pode render ao mesmo tempo muitas curtidas e até mesmo o tesão do parceiro, mas também pode gerar inúmeras dores de cabeça. O mercado humano tornou-se sinônimo de rede. E as timelines transformaram-se em pistas de competição de quem tem mais registros "felizes" do que o outro. Em tempos de superficialidade, individualismo e disputa de aparências cresce uma questão: seria a falsa e momentânea felicidade o troféu? 

A corrupção nossa de cada dia

 Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde 
e lentamente passo a mão nessa forma insegura. (Carlos Drummond de Andrade) 

 

 Em tempos de panelaços, a pauta nacional se tornou justamente uma das suas maiores famas: corrupção. Irônico ou não, os brasileiros levantam suas frigideiras nas janelas para mostrar indignação, enquanto em situações pequenas e rotineiras, deixam sua moral e dignidade serem descascadas por atitudes que se tornaram costumes nacionais. 
    Corrupção significa romper, quebrar. Corromper de várias formas, inclusive moralmente. De corrupção os brasileiros entendem -  aliás devem ser capazes até de achar mais sinônimos para essa palavra do que o próprio Aurélio. 
    Desde que nossos ancestrais aborígenes se vendiam por espelhos,  a terra dourada já sabia corromper e ser corrompida. Habilidades que parecem ter se tornado características físicas de muitos por aqui. 
     Há pouco tempo, em um ônibus, vivenciei um caso simples e que se repete com frequência na cidade onde eu moro. Em pleno horário de rush, um cobrador, irritado com o comportamento dos passageiros, que não andavam para trás e liberavam espaços para os outros, resolveu agir. Ele decidiu que os passageiros poderiam descer pela porta da frente, sem pagar. Para alguns, ele até devolveu o dinheiro que já haviam pago. Durante toda a viagem não vi uma pessoa recriminar esse ato. Eles nem sequer se preocuparam com a câmera próxima ao cobrador. 
    Outra situação bastante comum é o famoso "troco a mais do pão": já que vi depois, pra que devolver, né? 
    Nos espantamos com as prisões em operações judiciais e manifestações de insatisfação nacional. Mas, não seria necessária uma auto-avaliação antes de vestir a camisa "canarinha" e ir para a praça protestar? Não seria decente  levar a sério a ordem de chegada na fila do banco?  Vamos lá! Não demora muito tempo procurar no bolso as moedas que passaram a mais na quitanda.        
    Afinal, de tanto acharmos que "todo mundo faz", é que talhamos nossa fama corrupta. E, são essas pequenas mudanças cotidianas que ditam o caráter de alguém, e não as palavras de ordem lançadas em manifestações dominicais. 

 

A crise que eu (des) conheço 
 


"Nem é deste planeta... Por sinal 
Que o mundo se lhe mostra indiferente!" (Mario Quintana) 



   Vivenciei essa semana três situações que me fizeram questionar por onde é que anda a "senhora" crise econômica em Juiz de Fora. Será que está acampando na  Universidade Federal por melhores condições no ensino ou está na fila de espera do SUS? 
        Em tempos de seca, entressafra e, é claro, a "misteriosa" crise, tive o prazer de fazer uma matéria na Rádio em que sou estagiária sobre o preço dos alimentos na cidade. Produtos cativos das mesas brasileiras como batata, tomate, feijão e cebola têm pesado cada vez mais no bolso do consumidor. Em uma das entrevistas levei um susto que só me fez ficar ainda mais desconfiada dessa “crise” local. Um dos entrevistados me disse que o aumento nos valores é devido à entressafra e que não tem nada a ver com a situação econômica nacional. 
   Insatisfeita, quis ouvir um economista que me disse uma frase que me fez ganhar o dia. De acordo com ele, a entressafra sempre vai existir e os altos preços são frutos do período conturbado em que o Brasil se encontra. Bem que eu desconfiava que ela estava rondando JF. 
     Na sexta tive o prazer de conhecer um bar muito agradável, especializado em peixes, no centro da cidade. Chegamos lá cedo, mas não porque achamos que estaria lotado e, sim, porque queríamos aproveitar a noite. Ainda bem que escolhemos nos adiantar. Em pleno dia finas de  mes, o bar já estava com quase todas as mesas reservadas e conseguimos a última para nos acomodar. Aos poucos, o local começou a encher, até chegar em ao ponto de ter pessoas, à porta, esperando por um lugar. Não era dia promocional. Muito pelo contrário. Uma situação que se repete em diferentes estabelecimentos locais. Entre sushis e maravilhosas tilápias, eu me perguntei: mas como é que em dias difíceis os bares da cidade ganham ainda mais clientes? 
     Outro momento que me fez ficar incomodada foi a inauguração de um supermercado perto de minha casa. A franquia é conhecida por ter ótimas promoções; então resolvi conhecer os novos vizinhos. À medida que passava pelas sessões do lugar, vi carrinhos cheios como se estivéssemos no quinto dia útil. E o mais engraçado foi que não eram produtos como arroz, feijão ou verduras que lotavam os carrinhos, e sim vinhos caros, comida japonesa e afins, que nem em promoção estavam. 
    Sabemos que em tempos de economia aconselha-se a comprar o necessário, e onde se tem o melhor preço. O que se imagina é que o foco do consumidor seja esse. Mas, o que se vê, nos quatro cantos da cidade, são pessoas se esforçando para deixar claro aos que lhes rodeiam que a crise não tocou a sua campainha ainda. Em pleno fim de mês, os juiz-foranos se vestem da melhor forma para torrar seus cartões de crédito, onde possam fazer selfies e mostrar o quanto estão felizes e bem pagos. A alegria local tem me parecido ser para mascarar os problemas nacionais. Quem demonstra fraqueza deixa seu telhado frágil pra ser apontado pelo outro. Eu acho que a ideia é não deixar a grama do vizinho parecer estar mais verde que a sua. 

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